A morte de bebês no Hospital Infantil Francisco de Assis, em Guarapari, virou alvo de investigação do Ministério Público e também das Secretarias de Saúde Municipal e Estadual, a partir de denúncias de um grupo de mães. Um levantamento feito por elas aponta que 13 morreram em 2017, 18 em 2018 e pelo menos seis até o momento em 2019.
Hospital infantil Francisco de Assis, em Guarapari — Foto: Reprodução/TV Gazeta
O hospital, também chamado de Maternidade de Guarapari, é filantrópico, tem administração própria, mas é mantido com recursos públicos.
Uma das mães que passou pela situação de perder um bebê é a dona de casa Márcia Pereira de Souza. Ela contou que perdeu a filha Lara na 41ª semana de gestação, depois de ir ao hospital várias vezes sentido fortes dores e, mesmo assim, ser mandada de volta para casa.
“Foram dias de muita angústia. Eu vinha para o hospital, mas eles me davam medicação e me mandavam embora. Eu vinha de dois em dois dias com dor, mas aconteceu também de eu vir duas vezes no mesmo dia e não fazerem nada. Quando eu vim mesmo para a minha filha nascer, ela já estava morta. Minha filha não aguentou”, lembrou.
Márcia acredita que houve negligência médica, que deixaram passar da hora do parto porque a filha ingeriu mecônio (primeira fezes do bebê). Além disso, segundo ela, a criança não foi retirada por cesárea, e sim por parto normal.
“Minha filha ainda estava na barriga quando viram que ela tinha morrido. Me forçaram um parto normal com ela morta dentro de mim e quando ela saiu, viram que ela tinha engolido mecônio e me falaram que ela morreu sufocada. Mas na certidão de óbito, veio escrito que a minha filha morreu por hipertensão gestacional, sendo que todo mundo que acompanhou o parto viu que a minha filha tinha engolido fezes”, explicou.
A situação aconteceu em 2017. Márcia define que viveu o pior pesadelo da vida.
“Você segura a sua gestação por nove meses, esperando a sua filha, preparando o quarto, comprando roupinhas, pra chegar no dia de nascer e você receber uma certidão de óbito? Foi o que eu ganhei. Aquilo me matou, me destruiu. Nunca mais dormi direito pensando na minha filha, em como ela estaria hoje. Pra eles, foi mais um bebê que morreu, mas para mim não, era a minha filha”, disse.
Márcia está grávida novamente. Aos sete meses de gestação, ela teme passar pela mesma situação.
Márcia perdeu a filha Lara em 2017, na 41ª semana de gestação. A menina nasceu morta — Foto: Reprodução/TV Gazeta
O drama vivido pela dona de casa foi o mesmo da cunhada da gari Gilmara Ferreira dos Santos. Ela contou que tudo aconteceu há menos de 15 dias.
“Minha cunhada veio com dor, então aplicaram um remédio e mandaram ela embora, falaram que hospital não era SPA pra ela ficar deitada lá. Quinze dias atrás, ela voltou para ganhar neném, sentindo muita dor, mas aplicaram remédio de novo e mandaram embora. À noite ela veio e ficamos em casa esperando a notícia, mas recebemos a informação de que a neném tinha morrido porque tinha engolido água de parto, água com cocô. Acredito que morreu por negligência, porque ela estava com cesárea marcada, mas resolveram mandar ela pra casa”, disse.
Com tantas mortes semelhantes, o grupo foi criado para amparar essas mães.
“Nós criamos esse grupo para as mães terem voz, estão acontecendo muito casos, eles estão demorando muito a fazerem os partos. Passa da hora e eles se recusam a fazer uma cesárea”, falou a dona de casa Fabíola Pereira da Silva, que criou o grupo.
Ministério Público
O Ministério Público Estadual, por meio da Promotoria de Justiça de Guarapari, disse que já instaurou um procedimento para apurar os fatos. Caso sejam constatadas irregularidades, serão adotadas providências previstas em lei.
Secretaria Municipal de Saúde
A Secretaria Municipal de Saúde disse que se reuniu com o Comitê de Investigação e Acompanhamento de Óbitos para debater as mortes ocorridas no hospital de 2018. O grupo estuda prontuários, aciona órgãos de competência e de direito, acompanhando o andamento desses processos. Na reunião, a secretária Alessandra Albani cobrou um relatório de óbitos para análise.
O comitê fará reuniões mensais e visitas ao hospital para analisar esses prontuários.
Secretaria Estadual de Saúde
A Secretaria Estadual de Saúde informou que a Comissão Estadual de Monitoramento de Óbitos faz acompanhamento mensal das mortes e, em relação, aos casos ocorridos na maternidade, informa que estão sendo investigados.
Hospital
Utin do Hospital Francisco de Assis — Foto: Reproduçã/TV Gazeta
O superintendente do Hospital Francisco de Assis, Jailton Alves Pedroso, nega que exista negligência na unidade.
“Nós estamos aqui há cinco anos e tivemos essa quantidade de óbitos muito perto uns dos outros, o que criou um alarde na população. Essas mortes são de causas indeterminadas, não evitáveis pelo hospital. O hospital finaliza a gestação da mulher a partir de 39 semana, e a questão dela ir e voltar é normal porque ela está em andamento para o parto. Não é negligência do hospital, estamos aguardando o momento ideal”, disse.
Fonte: G1